Nos últimos anos, o empreendedorismo social tem se destacado como uma abordagem promissora para enfrentar desafios complexos no Brasil, como a desigualdade, o acesso limitado a serviços essenciais e a exclusão econômica.
Nesse contexto, o Modelo C surge como uma metodologia inovadora, capaz de integrar a criação de valor social e ambiental diretamente ao modelo de negócios de uma empresa, oferecendo uma estrutura que alia impacto positivo e sustentabilidade financeira.
O modelo é uma resposta a uma necessidade crescente: criar negócios de impacto que não apenas gerem retorno financeiro, mas que também tenham uma missão social central. Para entender sua aplicação e funcionamento, é importante mergulhar na história de sua criação, nas ferramentas que o compõem e nas maneiras práticas de implementá-lo no contexto brasileiro.
A história e o surgimento do Modelo C
O Modelo C foi desenvolvido por meio de uma colaboração entre a Move Social, o Sense-Lab, o Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) e a Fundação Grupo Boticário, com o objetivo de criar uma ferramenta que unisse duas abordagens previamente utilizadas de forma separada: o Business Model Canvas e a Teoria da Mudança.
Em 2015, esse grupo realizou oficinas e debates com diversos negócios de impacto social e ambiental, buscando uma maneira de integrar a estrutura de negócios com a geração de impacto. O resultado desse trabalho colaborativo foi a criação do Modelo C, lançado oficialmente em 2018.
O grande diferencial do Modelo C é que ele elimina a separação tradicional entre o planejamento financeiro e a criação de impacto social, propondo uma visão unificada. Para empreendedores sociais, essa ferramenta oferece um caminho claro para criar e escalar negócios que sejam sustentáveis financeiramente e, ao mesmo tempo, capazes de gerar mudanças positivas em larga escala.
Metodologia do Modelo C: Como funciona?
O Modelo C integra três componentes principais que trabalham em conjunto para garantir que tanto o impacto social quanto o modelo de negócios estejam profundamente conectados. Vamos detalhar cada um desses componentes:
1. Teoria da Mudança: Do Contexto ao Impacto
A Teoria da Mudança é uma ferramenta de planejamento e avaliação que mapeia o caminho para a transformação social, mostrando como uma série de ações podem levar aos impactos desejados. No Modelo C, a Teoria da Mudança ajuda os empreendedores a definir o contexto (os problemas sociais e ambientais que o negócio pretende resolver) e a visão de impacto (as mudanças que o negócio quer ver no mundo a longo prazo).
Para construir a Teoria da Mudança, os empreendedores devem responder a perguntas essenciais, como:
Qual é o problema social ou ambiental que desejamos resolver?
Quais são as causas desse problema?
Qual é a solução que estamos propondo e quais são as intervenções necessárias?
Quem é o público-alvo das nossas intervenções?
Quais são os resultados esperados a curto, médio e longo prazo?
A abordagem traz uma visão clara da lógica de impacto, garantindo que todas as ações do negócio estejam alinhadas com a transformação social desejada.
2. Business Model Canvas: O fluxo de captura e entrega de valor
O Business Model Canvas é uma ferramenta tradicional usada para planejar e visualizar o modelo de negócios de uma organização. Ele descreve como o negócio cria, entrega e captura valor. No contexto do Modelo C, o Canvas é expandido para incluir não apenas as dimensões financeiras e operacionais, mas também o impacto social.
No Modelo C, o Canvas é reorganizado em três fluxos principais:
Fluxo de Negócios: Esse fluxo descreve como o negócio irá gerar receitas e sustentar suas operações. Ele inclui elementos como proposta de valor, segmentos de clientes, canais de distribuição, parcerias estratégicas e estrutura de custos.
Fluxo de Impacto: O impacto social ou ambiental gerado pelo negócio é mapeado ao lado do fluxo de negócios. Aqui, estão incluídas as intervenções planejadas, o público-alvo das ações e os resultados esperados. Esse fluxo mostra como as ações do negócio estão diretamente conectadas aos resultados sociais.
Capacidade Organizacional: Essa dimensão do modelo foca nos recursos humanos, parceiros, atividades-chave e recursos materiais necessários para que o negócio funcione de maneira eficaz e alcance seus objetivos de impacto. A equipe e os parceiros são considerados essenciais para garantir que o impacto seja gerado de forma sustentável.
3. Integração entre Negócio e Impacto
Uma das maiores inovações do Modelo C é a maneira como ele integra o impacto social ao modelo de negócios. Diferente de abordagens tradicionais, onde o impacto social é tratado de forma separada, no Modelo C o impacto e o negócio são inseparáveis. Isso significa que as mudanças no modelo de negócios (como novos produtos ou mudanças nas fontes de receita) podem afetar diretamente a capacidade do negócio de gerar impacto social, e vice-versa.
Essa integração é representada no modelo visual do Canvas, onde os blocos que tradicionalmente representam o negócio são espelhados por blocos equivalentes focados no impacto social. Por exemplo, enquanto o lado financeiro do Canvas mapeia os clientes e a proposta de valor, o lado do impacto mapeia o público beneficiado e as intervenções sociais.
4. Como aplicar o Modelo C na prática?
Para aplicar o Modelo C, os empreendedores devem seguir um processo colaborativo e contínuo de planejamento. O modelo é idealmente construído em equipe, onde todos os envolvidos têm a oportunidade de contribuir com sua visão. Algumas dicas práticas incluem:
Reunir a equipe: Envolver todas as partes interessadas no processo de construção do modelo garante uma visão mais completa e colaborativa.
Começar pela Teoria da Mudança: O impacto social é o objetivo central de um negócio de impacto. Por isso, o primeiro passo no uso do Modelo C deve ser mapear o impacto desejado usando a Teoria da Mudança.
Usar a estrutura em etapas: Após definir o impacto, o próximo passo é mapear o fluxo de negócios e, por fim, garantir que a capacidade organizacional seja adequada para entregar os resultados desejados.
Um exemplo prático da aplicação do Modelo C pode ser visto no caso do Araucária+, um negócio de impacto que trabalha com a valorização de produtos derivados da floresta de araucárias, como pinhão e erva-mate. Esse projeto conseguiu alinhar a conservação ambiental com a geração de renda para produtores rurais ao utilizar o Modelo C para estruturar suas atividades e medir o impacto socioambiental gerado.
O Modelo C oferece uma abordagem inovadora para empreendedores que desejam criar negócios de impacto social no Brasil. Ele não apenas facilita o planejamento estratégico, mas também garante que o impacto social e ambiental esteja no centro do modelo de negócios, tornando-o mais robusto e eficaz. Para um país com desafios sociais e econômicos profundos, essa metodologia é uma ferramenta valiosa para criar soluções sustentáveis e escaláveis.
A abordagem é das possibilidades de uma solução prática e eficaz para aqueles que desejam criar negócios de impacto social no Brasil. Ele não é apenas uma teoria ou uma tendência passageira, mas uma estrutura que pode ajudar os empreendedores a superar desafios, escalar suas soluções e, acima de tudo, gerar transformação social.
Para empreendedores que estão começando ou que já têm um negócio social, o Modelo C oferece um caminho claro para alinhar propósitos sociais e resultados financeiros.
Além disso, a ênfase na medição de impacto e na inovação contínua garante que o negócio permaneça relevante e eficaz ao longo do tempo.
Por fim, é importante lembrar que o impacto social não precisa ser um objetivo secundário. Com o Modelo C, o impacto pode e deve ser o coração do negócio, criando uma sinergia que beneficia tanto o empreendedor quanto as comunidades atendidas.
Igor Drudi
CEO Drin Inovação
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